20140421

opinião > PAULO RAMALHO










 

União Europeia: Um projeto ainda em construção
Está à porta a campanha eleitoral para o Parlamento Europeu, e já se percebeu que o debate vai ficar, no essencial, monopolizado por questões da actualidade política doméstica, do género se “o Governo liderado por Passos Coelho está a governar mal ou bem”, e por consequência, se merece ser castigado pelos eleitores, ou pelo contrário, um voto de reconhecimento e confiança. E da União Europeia, dos desafios com que esta se confronta e dos diferentes caminhos que se perfilam, pouco, ou apenas residualmente, se vai falar. Nem sequer do papel que Portugal deverá ter na Europa…
E também não temos grandes dúvidas, que a relativa indiferença dos portugueses, no que concerne à participação no próximo acto eleitoral, não vai ser muito diferente do já evidenciado há cinco anos atrás. Recordamos que em 2009, a taxa de abstenção nas eleições para o Parlamento Europeu atingiu os 63,2%, tendo votado apenas 3.568.943, dos 9.704.559 eleitores inscritos.
Tudo isto numa época, em que a vida dos portugueses está cada vez mais condicionada pelas opções que são sufragadas no âmbito da União Europeia. E sejamos sinceros, o que quase todos sabem e sentem de forma efectiva nas realidades mais simples do seu quotidiano: o “Escudo”, a nossa moeda nacional, há muito que desapareceu para dar lugar ao “Euro”; hoje não precisamos de exibir o “passaporte” para entrar em Espanha, em França ou na Alemanha, ou noutro qualquer Estado-membro da União; uma boa parte dos nossos equipamentos e infra-estruturas (auto-estradas, escolas, etc..) são co-financiados por “fundos comunitários”; o programa de assistência económica e financeira, a que ainda estamos sujeitos, tem uma participação activa do Banco Central Europeu e da Comissão Europeia… Pelo menos isto, o menos atento dos portugueses sabe e já ouviu falar.
Agora, o que muitos já não se recordam, é que quando Portugal (conjuntamente com a Espanha) aderiu a este projecto de Europa Unida, em 1 de Janeiro de 1986, este projecto tinha uma outra denominação, “CEE-Comunidade Económica Europeia”, tendo evoluído para a actual “UE - União Europeia” em 1992, por força do tratado de Maastricht. E que tal não se traduziu numa simples mudança de “nome”, mas constituiu uma nova e importante etapa na integração europeia, ultrapassando o objectivo económico inicial da comunidade, designadamente de um mercado comum, para uma progressiva integração política, que respondesse, designadamente, a quatro objectivos principais: reforço da legitimidade democrática das instituições, instauração de uma União Económica e Monetária, instituição de uma política externa e de segurança comum e um maior desenvolvimento da vertente social da Comunidade.
E seguramente, serão ainda menos os que se lembram das verdadeiras razões que presidiram à constituição deste grande projecto europeu, que formalmente resultou da assinatura do Tratado de Roma subscrito em 25 de Março de 1957 pela França, Itália, Republica Federal Alemã, Bélgica, Holanda e Luxemburgo, mas que teve a sua génese com a famosa “declaração Schuman”, de 9 de Maio de 1950, em que Robert Schuman, então ministro dos negócios estrangeiros do governo francês, apresentou uma proposta de criação de uma Europa organizada, que permitisse relações pacíficas entre os Estados Europeus que estavam a recuperar dos efeitos da II Guerra Mundial. Ou seja, que a União Europeia nasceu com o principal objectivo de promover a paz no interior do território Europeu, que nos últimos duzentos anos tinha assistido a sucessivas e destrutivas guerras.
É claro que esta pequena incursão histórica não visa penalizar os portugueses menos atentos ou mais esquecidos. Mas simplesmente lembrar, que a União Europeia é um projecto ambicioso e complexo, ainda em construção, que precisa de uma participação activa da sociedade civil para a sua concretização e legitimação.
E reconheça-se que o primeiro objectivo que este projecto europeu se propôs alcançar tem tido um amplo sucesso. A Europa vive há cerca de 70 anos sem conflitos bélicos, designadamente dentro dos países da União. Claramente, um dos mais longos períodos de paz da sua história.
A Comunidade Europeia que começou com seis países, integra hoje vinte e oito Estados-membros. E os pedidos de adesão são constantes. Até a Ucrânia já o equaciona…
A concretização de um mercado comum, de um espaço de livre circulação de pessoas e bens, alavancado nos princípios da livre concorrência, também é uma realidade bem encaminhada na Comunidade Europeia.
Mas devemos reconhecer, que apesar dos esforços traduzidos nos Tratados entretanto assinados em Amesterdão (1997), Nice (2001) e Lisboa (2007), muitos dos objectivos deste projecto europeu estão ainda por alcançar. Desde logo, apenas 18 dos 28 Estados que nesta altura fazem parte da União Europeia aderiram ao “Euro”, permanecendo ainda fora da “moeda única“ dez Estados-membros, entre eles, o Reino Unido. A coesão social e económica está longe de ser uma realidade dentro do território da Comunidade Europeia. E sobre esta matéria, a grande maioria dos portugueses tem profundo conhecimento…
A título de exemplo, o salário mínimo é nesta altura em Portugal de € 485,00, quando no Luxemburgo é de € 1874,00, na Bélgica de € 1502,00, na Holanda de € 1478,00, na Irlanda de € 1462,00 e na França de € 1430,00. Actualmente, a média da taxa de desemprego dentro da União Europeia é de 10,6%, e na Alemanha de apenas 5,1%. Mas na Grécia, a taxa de desemprego atinge os 27,5%, na Espanha os 25,6% e em Portugal os 15,3%. Em 2013, o valor do PIB/per capita no Luxemburgo era de 271% da média da União Europeia, na Áustria de 131%, na Irlanda de 129%, na Holanda e Suécia de 128% e em Portugal de 75% da mesma média da UE.
Robert Schuman, que também foi o primeiro presidente do Parlamento Europeu, defendia que a “Europa não se fará de uma só vez, nem numa construção de conjunto”, mas “por uma solidariedade de facto”.
Toda a razão. Mais que um conjunto de países, a União Europeia é formada por diversas nações, por diferentes regiões, com especificidades culturais, sociais e económicas muito distintas, que têm de ser respeitadas, mas ao mesmo tempo, envolvidas e mobilizadas para um projecto comum, em que o sentimento de “bem-estar” dos cidadãos será, cada vez mais, um factor decisivo para o sucesso.
Daí que muito do futuro da União Europeia estará na capacidade desta se afirmar como um território verdadeiramente solidário, como alvitrava Schuman. E para tal, é fundamental investir mais no desafio da coesão social e económica e da aproximação da União aos seus cidadãos.
Agora, é muito importante que todos nós, cidadãos europeus, assumamos também as nossas próprias responsabilidades.
Paulo Ramalho
Vereador do Desenvolvimento Económico e das Relações Internacionais da Câmara Municipal da Maia

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